Lembro-me muito bem do porte altivo e do respeito que impunham junto das populações humildes e laboriosas das montanhas.
A pé, a cavalo, de jipe ou de motociclo, calcorreavam as serranias, vigiavam, fiscalizavam, orientavam os trabalhos, anotavam e distribuíam jornas, mobilizavam os populares no combate aos fogos, concediam licenças para cortar mato, autuavam os que prevaricavam.
No meio de tanta azáfama ainda tinham tempo para fazer filhos em solteironas sonsas e encruadas ou saciar a fome de sexo de algumas "viúvas" cujos maridos partiam para outras paragens em busca de vida melhor e só regressavam muito tarde ou nunca.
Os Guardas Florestais eram a face visível de uma boa organização e gestão florestal que ocorreu em meados do século passado.
Foram os Serviços Florestais que "colocaram no mapa" muitas povoações que sempre tinham permanecido no mais completo isolamento através dos estradões que construíram, das casas dos guardas disseminadas por locais pitorescos, dos telefones rudimentares que ligavam essas casas aos serviços regionais e centrais.
Porém, sendo uma obra do Estado Novo, foi completamente votada ao ostracismo após a Revolução de Abril, à semelhança de outras realizações reaccionárias.
O resultado está à vista.
Sem organização e sem planeamento, as sementes lançadas nessa época foram-se reproduzindo sem nexo dando origem a uma floresta desorganizada e explosiva. As alterações climáticas, o êxodo das populações rurais, a ganância de alguns e a indiferença de outros transformaram este jardim à beira mar plantado numa enorme e negra mancha de cinza e carvão.
Não foi, certamente, numa paisagem assim que Luís de Camões se inspirou:
Verdes são os campos,
Da cor de limão:
Assim são os olhos
Do meu coração.
Campo, que te estendes
Com verdura bela;
Ovelhas, que nela
Vosso pasto tendes,
De ervas vos mantendes
Que traz o Verão,
E eu das lembranças
Do meu coração.
Gados que pasceis
Com contentamento,
Vosso mantimento
Não no entendereis;
Isso que comeis
Não são ervas, não:
São graças dos olhos
Do meu coração.
Coimbra, 13 de Outubro de 2005
Do autor
Velhos conhecidos
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